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terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

A cama da bamba

Por Rec Haddock

 A mulata não sambava. A comunidade toda perguntava porquê ela não sambava, mas ela não dava a resposta pra ninguém. Só sorria como quem sabe de alguma coisa que os outros não sabem.
Até mesmo dona Zefa, filha do lendário sambista Jão Jorge, dona de uma fama de mulher sábia da velha guarda, não arrancava a resposta da mulata. De tanto tentar desistiu. Dizia: “Deixa essa mulata quieta. Ela não precisa sambar com os pés. Ela leva o samba no sorriso”.
E ela levava mesmo. Levava o samba na malandragem carioca, no jeitinho brasileiro, na ginga tupiniquim que não tem gringo nenhum que replique. E quando ela passava com aquela malemolência, ah, mas não tinha paranauê que não ficasse de pé.
“Mulher boa é que nem novela boa. Tem sempre um mistério pra resolver no último capítulo”, seu Túlio do açougue dizia. E completava: “Mas não tem ninguém que não queira resolver essa mulata antes da novela terminar, não é mesmo?” Seu Túlio tentou, mas a mulata não deu bola. A mulata não dava bola pra homem nenhum.
Todo carnaval, ela botava uma máscara, ia pra Avenida, e ficava só olhando. Só olhando. Não sambava, não falava, não cantava. Só procurava. Ninguém sabe ao certo o que aquela mulher procurava. Nem a própria mulata sabia o que a própria mulata queria. Mas ela procurava com afinco.
Um dia o destino do mistério encontrou o destino dela. Um homem sem máscara, nem fantasia, nem bandeira no carnaval. Sem saber como, foram parar na casa dela. Ele nem falava português, mas ela disse pra ele mesmo assim.

O samba dela, ela só entregava com o coração.
          
           Naquela noite a folia foi eterna.
           Naquela noite a mulata sambou. E como sambou.



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