Por Rec Haddock
A
mulata não sambava. A comunidade toda perguntava porquê ela não sambava, mas
ela não dava a resposta pra ninguém. Só sorria como quem sabe de alguma coisa
que os outros não sabem.
Até
mesmo dona Zefa, filha do lendário sambista Jão Jorge, dona de uma fama de
mulher sábia da velha guarda, não arrancava a resposta da mulata. De tanto
tentar desistiu. Dizia: “Deixa essa mulata quieta. Ela não precisa sambar com
os pés. Ela leva o samba no sorriso”.
E
ela levava mesmo. Levava o samba na malandragem carioca, no jeitinho
brasileiro, na ginga tupiniquim que não tem gringo nenhum que replique. E
quando ela passava com aquela malemolência, ah, mas não tinha paranauê que não
ficasse de pé.
“Mulher
boa é que nem novela boa. Tem sempre um mistério pra resolver no último
capítulo”, seu Túlio do açougue dizia. E completava: “Mas não tem ninguém que
não queira resolver essa mulata antes da novela terminar, não é mesmo?” Seu Túlio
tentou, mas a mulata não deu bola. A mulata não dava bola pra homem nenhum.
Todo
carnaval, ela botava uma máscara, ia pra Avenida, e ficava só olhando. Só
olhando. Não sambava, não falava, não cantava. Só procurava. Ninguém sabe ao
certo o que aquela mulher procurava. Nem a própria mulata sabia o que a própria
mulata queria. Mas ela procurava com afinco.
Um
dia o destino do mistério encontrou o destino dela. Um homem sem máscara, nem
fantasia, nem bandeira no carnaval. Sem saber como, foram parar na casa dela.
Ele nem falava português, mas ela disse pra ele mesmo assim.
O samba dela, ela só entregava com o coração.
Naquela noite a folia foi eterna.
Naquela
noite a mulata sambou. E como sambou.
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