Cada dia da nossa vida é de um jeito. Sem regras ou com regras.
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Aqui cada dia é dia de um texto diferente.
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quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

De repente

Por Marcela de Holanda


— Carla!


— Oi. Nem tinha te visto aí. Tudo bem, Marina?


— Tudo. Agora tá tudo ótimo. Casei. Estou esperando meu primeiro filho...


— Nossa. Parabéns. Como o tempo passa, né?


— Pois é. Tem o que? Oito anos? Acho que é isso, oito anos que você desapareceu do nada, parou de responder minhas mensagens e atender minhas ligações.


— Oito anos? Tudo isso?


— Tudo isso. Mas não se preocupa, eu demorei uns três anos mas achei uma nova melhor 
amiga.


— Olha, Marina. Eu não sei nem o que te dizer. Desculpa. Eu sei que foi muita covardia da 
minha parte sumir sem dar explicação. Mas...


— Mas o que? O que aconteceu? O que foi que eu fiz? Eu juro que pensei muito mas não 
consegui imaginar nenhuma razão para você se afastar sem me dar nenhuma satisfação. A gente se via todos os dias. Você era tratada pela minha família como se fosse minha irmã. 


— Eu sei. Eu sei. Você não fez nada. Por isso eu não tive coragem de falar qualquer coisa. Eu cheguei da sua casa, fui dormir e quando acordei no dia seguinte eu já não era mais sua amiga. Eu simplesmente sabia que não era. Sabia que não ia conseguir olhar mais para você porque você ia perceber. E ia querer uma explicação. E eu não saberia o que dizer. Mas sabia que não queria fazer mais nada com você. Me desculpa. Realmente. Eu não sei porque isso aconteceu.

— Nossa. De todos os motivos que eu cogitei nenhum era tão ruim quanto não ter motivo nenhum. Você sabia que eu perdi meu pai na semana seguinte? Você imagina o quanto eu precisava de você? Mas ouvindo você falar agora eu acho que foi melhor assim mesmo. Você não era o tipo de pessoa que eu pensava que era. 


— Não. Eu não sabia. Sinto muito. Mas não foi minha culpa, sabe? Foi uma coisa incontrolável. Para você ter uma ideia. Lembra de como eu era viciada em chocolate?


— Claro que lembro. Eu sempre estava acima do peso porque comia junto. E você não engordava nada.


— Então. No mesmo dia em que eu acordei e não era mais sua amiga eu também acordei e não queria mais comer chocolate.


— Ah, tá. Aí sim. Foi um desequilíbrio mental grave então. Chegou a ser internada?


— Para. É sério. Só que uns dias depois eu já queria comer de novo. Mas como eu nunca mais tive vontade de ser sua amiga, eu não achei justo e não comi mais chocolate.


— Poxa. Quanta consideração. Obrigada.


— Ouve. Eu sei que eu te magoei. E que o que eu fiz não tem perdão. Mas saiba que eu nunca deixei de desejar que você fosse feliz.


— Eu também. Apesar da raiva, de não compreender e tudo. Eu sempre torci para que você estivesse feliz em algum lugar.


— Obrigada, Marina. Você sempre foi uma excelente amiga.  E vai ser uma mãe maravilhosa. Tenho certeza.


— Obrigada. Eu também acho que sim. Toma.


— O que é isso?


— Não era esse o seu chocolate preferido? Pode comer. Se liberta. A vida seguiu e eu também.


— Obrigada. Quem sabe a gente não marca de sair para conversar melhor e...


— Não. Melhor não.


— É. Tem razão. Bom, de repente um outro dia a gente se esbarra por aí.


— É. De repente. Quem sabe?



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