Cada dia da nossa vida é de um jeito. Sem regras ou com regras.
De qualquer forma, nada é igual.
Aqui cada dia é dia de um texto diferente.
Quer sair da rotina? Fica com o Salada!

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

O sonho acabou

Por Bernardo Sardinha

Um sonho louco. Um sonho simples. Um sonho impossível de ser realizado, mas que vale a pena. O sonho? Comer todas as mulheres do mundo. E, para ele, o carnaval era a época onde o sonho, não parecia tão impossível. 

Organizou em uma planilha Excel um roteiro dos melhores blocos. O que ele chama de blocos classe A (onde há uma boa proporção homem/mulher) e para cada um, bolou uma fantasia diferente.

 No primeiro dia de carnaval começaria sua maratona vestido de bombeiro, meio dia era a vez de se vestir de Rambo e a tarde era a hora de colocar a “batina”. O esquema de fantasias rotativas já tinha sido testado com sucesso no carnaval do ano passado. Assim, ele ficava sempre cheiroso, com aparência de limpo e estaria devidamente disfarçado caso esbarrasse com um “affair” de outro bloco.

Terceiro e último bloco classe A do dia. Com sucesso parcial nos outros (pegou mas não “finalizou”), estava bastante confiante. Sua primeira vítima seria uma loirinha vestida de fada e antes de falar com ela sentiu um frio na barriga.

Chegou nela e após vinte minutos, estava com a língua dela na sua boca.

- Rambo? – disse ela após o beijo.

- Perdão?

- Sou eu! A coelhinha? Não lembra? Você estava de Rambo agora no Suvaco do Cristo e eu de Coelhinha!

 O que dizer em uma situação dessas? Ele apenas deu um sorriso amarelo como a camisa da seleção.

- Eu troco de fantasia para fugir dos chatos que fiquei dos outros blocos.

O cupido foi rápido e irônico. Não foi amor a primeira vista, foi amor no segundo bloco. 

Naquele carnaval o sonho acabou.

Amor é algo estranho. 


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quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

SÓ NO CARNAVAL!!!

Por Marcela de Holanda

Só no Carnaval
Alegria é a regra geral
Pelada na Avenida é natural
Conhecer é beijar na boca
1 é pouco, 2 é pouco e 3 ainda é pouco
Excesso de peso era reinado
Marcha não é coisa de soldado
O metrô funciona sem parar
Escola não é para estudar
A segunda-feira é sempre bem-vinda
O homofóbico de saia dá pinta
O que viveu reprimido se liberta
Lotado, apertado e abafado é festa
Só no carnaval
Viva o carnaval!
Para quem quer o carnaval
Os que não quiserem que abram alas
Porque querendo ou não ele vai passar

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Às Quartas – Parte 5

Por Marcela de Holanda

           Descabelada e com falta de ar, descreveu para o porteiro o homem que era agora a sua vida mesmo sem saber o nome ou ter ouvido a voz. O porteiro disse que conhecia, claro, o senhor Miguel. Muito gente fina. Trabalha no quinto andar. Mas não tem aparecido por aqui não, moça.
 Não quis pegar a fila do elevador. Subiu tropeçando nas escadas até o quinto andar. Conseguiria o endereço da casa dele ou do hospital. Havia apenas uma firma no quinto andar com uma recepção elegante. Já chegou se desculpando com a recepcionista, dizendo que era uma longa história, mas precisava saber do Miguel.
 Foi só falar o nome dele e as lágrimas começaram a rolar do rosto da desconhecida. Péssimo sinal. Sim, ela sabia notícias dele. Sim, ele estava mesmo doente. Não, ele não voltaria mais. Não tinha resistido. Faleceu uma hora antes da operação.

 Quando ela pensou que ele mudaria sua vida, não imaginou que poderia ser para pior. Como ela podia continuar vivendo com aquela incompletude? Por que Deus tinha feito da vida dela uma piada de mau gosto? Estava tudo errado. Ela precisava dele. Precisava dar para ele aquele amor e para mais ninguém. E agora não lhe restava nem o direito de sonhar com isso.

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terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

A cama da bamba

Por Rec Haddock

 A mulata não sambava. A comunidade toda perguntava porquê ela não sambava, mas ela não dava a resposta pra ninguém. Só sorria como quem sabe de alguma coisa que os outros não sabem.
Até mesmo dona Zefa, filha do lendário sambista Jão Jorge, dona de uma fama de mulher sábia da velha guarda, não arrancava a resposta da mulata. De tanto tentar desistiu. Dizia: “Deixa essa mulata quieta. Ela não precisa sambar com os pés. Ela leva o samba no sorriso”.
E ela levava mesmo. Levava o samba na malandragem carioca, no jeitinho brasileiro, na ginga tupiniquim que não tem gringo nenhum que replique. E quando ela passava com aquela malemolência, ah, mas não tinha paranauê que não ficasse de pé.
“Mulher boa é que nem novela boa. Tem sempre um mistério pra resolver no último capítulo”, seu Túlio do açougue dizia. E completava: “Mas não tem ninguém que não queira resolver essa mulata antes da novela terminar, não é mesmo?” Seu Túlio tentou, mas a mulata não deu bola. A mulata não dava bola pra homem nenhum.
Todo carnaval, ela botava uma máscara, ia pra Avenida, e ficava só olhando. Só olhando. Não sambava, não falava, não cantava. Só procurava. Ninguém sabe ao certo o que aquela mulher procurava. Nem a própria mulata sabia o que a própria mulata queria. Mas ela procurava com afinco.
Um dia o destino do mistério encontrou o destino dela. Um homem sem máscara, nem fantasia, nem bandeira no carnaval. Sem saber como, foram parar na casa dela. Ele nem falava português, mas ela disse pra ele mesmo assim.

O samba dela, ela só entregava com o coração.
          
           Naquela noite a folia foi eterna.
           Naquela noite a mulata sambou. E como sambou.



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segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Quarta-Feira de Cinzas

Por Danilo Marcks


Sábado tem folia
Sábado tem alegria
E no domingo você vai torcer pra sua escola campeã
Eu vou deitar sem esforço nenhum
E depois costurar a nossa fantasia
Verde
Rosa
Vermelha
Lilás
Domingo segue a folia
Domingo tem alegria
E no domingo você vai despertar
Eu vou ficar pra ver você passar
Carnaval de ilusão
Verão!
Um ano passa
Na segunda não sei não
Já estou na contramão
Não bebi em nenhum porre
A noite você vai dormir no meu edredom
42 graus de febre
Verão!
Liga o ar pra dar vazão
Carnaval de ilusão
O amor na contramão
Terça-feira eu não saio não
Já sai do edredom
Já fui lá à rua desfilar
Despedaçado de paixão
Com um grande coração
Seu amor cansou demais
Já não tenho mais a paz
Carnaval de ilusão
Eu  e você na contramão
Amanhã vai acabar
É melhor não estragar
Nossa quarta feira de cinzas
Já tá na hora de acordar
Acompanhar a apuração
É, o nosso coração
Nota, 8, 7 ,6
5, 4, talvez 3
Amanha não vou fugir
Quarta-feira de cinzas
E no fim do carnaval
Descobri que tudo anda mal
E que amanhã já é quarta-feira de cinzas


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domingo, 23 de fevereiro de 2014

Isso vem de outros carnavais...

Por Halliny Lima

Eu tinha uns 9
Entre outros de 11, 12
E eu...
Mais uma ali;
Era meu primeiro carnaval
Matinê ainda
Estilo marchinha
Com fitas, laços
Confete e serpentina;
Lembro como hoje
Saia rosa bufante
Um colã
E o salão extravagante
Aquela vontade de ser adulta
E dançar até o cair do dia
Sabia que mais tarde
A festa se estenderia
E o carnaval realmente seria
A festa da carne
Mas me lembro de alguém
Ali
No meio de pierrôs e colombinas
Um  certo pierrô
Procurando uma  certa colombina
Nossos olhares se encontraram
Devo ter ficado enrubescida
Comecei a entrar no ritmo
“A La La ô
ô ô ô
ô ô ô
Mas que calor
ô ô ô
ô ô ô”
O menino de uns 10 se aproximou
Parece ter esperado a música:
“Linda morena, morena
Morena que me faz penar
A lua cheia que tanto brilha
Não brilha tanto quanto o teu olhar”
E meu deu uma rosa
Do enfeite de uma mesa
Eu fiquei assim...toda...
“Ó abre alas que eu quero passar
Ó abre alas que eu quero passar”
E fui acompanhando o menino
De longe
Me esperava lá fora
Parado
Com cara de pierrô apaixonado
Cheguei bem perto
Ele mais
E no embalo de “Aurora”
Tocou meu rosto
E...
E o que pude saber
É que esse calor
Essa fúria
Essa paixão
Vem de outros carnavais...

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sábado, 22 de fevereiro de 2014

Quarta-feira

Por Rodrigo Amém


Ao lado da coroa de flores, a imagem de São Jorge oscilava a luz de velas. Clara tirava da bolsa o último lencinho descartável. Pelas paredes o surdo sincopado reverberava vindo das ruas, pressionando o silêncio do ambiente hermético. Um palhaço entrou e limpou a garganta, pedindo atenção.

- Dona Clara. Estamos prontos.

Clara levantou a cabeça e contemplou a figura de sapatos exageradamente grandes, peruca, nariz vermelho e maquiagem ao lado do caixão de Mauro. Algo que lembrava um sorriso se fez notar em seu rosto por um segundo. Ela se levantou.

- Mais uma vez, Dona Clara. Eu quero pedir desculpas pela correria... e pelos trajes. A senhora sabe...

- Não precisa se desculpar. Eu sei que você está abrindo uma exceção. E é pra atender o desejo dele.

- Por aqui, por favor – conduziu o palhaço.

Na sala adjacente, um homem baixo, peludo e de bigode grosso preparava o que parecia ser uma esteira de metal junto a uma enorme máquina colada à parede. A não ser pelo vestido de baiana, o turbante cheio de frutas e os enormes brincos, o homem mantinha a expressão fechada. Ao seu lado, um rapaz magricela vestido de Teletubbie anotava algo numa prancheta. Os dois pararam quando a bailarina e o palhaço entraram na sala.

- Estes são meus assistentes, Dona Clara. Rapazes, por favor. – O palhaço apontou para a sala anterior. Os dois saíram apressados para trazer o caixão.

Em alguns momentos, Mauro já estava sobre a esteira. Solenes, o palhaço, a baiana, a bailarina e o Teletubbie. Observam o esquife.

- Podemos começar, Dona Clara?

- Vocês se importam se eu disser algumas palavras antes?
Todos balançaram a cabeça em respeito.

- Eu conheci Mauro no Carnaval. Faz 20 anos. Aqui no Rio. Ele estava de padre sacana. Eu estava de Mortícia Adams. Foi no Cordão da Bola Preta. Foi a última vez que nossas fantasias de carnaval não combinaram. Mauro dizia ser um homem de duas paixões. O carnaval e eu. Não necessariamente nessa ordem. A gente se mudou do Rio, mas a gente sempre voltava para o carnaval. Ele fazia questão. Quando ele ficou doente, o médico recomendou que seria arriscado viajar. O esforço seria “irresponsável”. Mauro me olhou e disse: não tem risco que me separe dos meus dois amores. Quando ele caiu, ali, do lado da bateria, a gente já sabia. Ele só me disse: “se eu fui feliz nessa vida, foi porque um amor sempre me trouxe para visitar o outro”. Acho que é hora da gente revezar, meu amor. É hora do carnaval te levar. Mas eu juro, meu amor, eu sempre voltarei pra vocês. Fica em paz, meu amor.

Clara soluçou, olhou para o palhaço e fez que sim com a cabeça. A baiana de bigodes enxugou uma lágrima, e apertou o botão que abriu o crematório. A esteira metálica conduziu o caixão para dentro da máquina. As labaredas começaram a lamber a madeira e a porta se fechou, isolando o calor do forno. A bailarina, o palhaço, a baiana e o teletubbie se uniram numa prece silenciosa e espontânea. Pelas paredes, o surdo lá fora reverberava numa cadência que lembrava “Bandeira Branca”.


Clara despejou as cinzas de Mauro no percurso do último bloco do carnaval, para que as sandálias das passistas partilhassem com ele seu último samba. 



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sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

O milagre do carnaval

Por Amanda Leal

Deusemar, mulata, corpo escultural, 30 anos e um sonho: desfilar no carnaval. Sair na Sapucaí não era apenas um desejo, mas sim um objetivo que ela tinha certeza de que iria conquistar. Não queria sair em carro alegórico, não queria sair na diretoria, queria apenas percorrer a avenida sambando com pouca roupa e absorvendo a energia do samba.

2013 foi um ano de muito trabalho, fez faxina para complementar o orçamento de doméstica e até ajudou a cuidar dos cachorros dos patrões durante uma viagem deles. Tudo isso para bancar a tão sonhada fantasia. Economizou no presente de Natal da família, pois qualquer graninha era bem-vinda.

Deusa, como era conhecida, tinha um filho. O pequeno Sidney. O menino agitado e sapeca tinha cinco aninhos e já vivia a dois sem seu pai. Cléber morreu durante uma incursão dos policiais na comunidade onde trabalhava, era homem honesto e trabalhador e mais uma vítima de bala perdida.

O ano do objetivo foi bem complicado, cheio de impedimentos, mas no fim lá estavam: os quatro mil reais de sua fantasia. Sorte da Deusa ter um primo que trabalha no barracão. Ele até tinha conseguido que ela desfilasse de graça, mas seria sem fantasia, ao lado da galera da escola. Sem fantasia? Nada feito para ela.

Finalmente chegou o grande dia e Deusemar era só expectativa. Acordara cedo para fazer o cabelo, pegou um pouco de sol na lage, já tinha combinado com a mãe que tomaria conta de Sidney. E por falar nele, o menino acordou um pouco quietinho hoje. Com uma tossezinha chata. Deve ser gripe, afinal de contas criança gripa toda hora.

A hora do desfile foi se aproximando e Deusa estava cada vez mais linda, montada em sua fantasia cheia de plumas e paetês. As amigas da comunidade morriam de inveja. Nessa hora todas lamentaram por não ter os quatro mil reais para também poder sambar na avenida. Deusa além de linda era guerreira.

Foi até o quarto do filho e estranhou novamente a aparência do menino. Resolveu sentar ao seu lado e esperar um pouco mais, mas o tempo ia passando, passando e a preocupação com a condução e com o menino aumentava. Se saísse agora chegaria a tempo na Sapucaí, se demorasse mais corria o risco de ter que sambar dentro do ônibus.

O menino só piorava, estava com um febrão. A mãe de Deusa disse que ela poderia ir tranquila, que daria conta de cuidar do menino. Deusa fez que ia umas quatro vezes e do meio do caminho, voltou. Coração de mãe. Ela sabia que precisava estar ali.
Assistir pela tv só aumentava sua agonia e a fazia lembrar do tamanho sacrifício que foi até chegar esse dia. A febre do menino aumentava e resolveram levá-lo para a Upa mais próxima.

Chegando lá tiveram sorte, muita sorte de estar vazio. Parecia que estava todo mundo em algum outro lugar. E realmente estavam, estavam em seus mundos particulares curtindo o carnaval. Os médicos até que permaneciam de bom humor, o que era estranho, pois ninguém gosta de trabalhar quando todo mundo está se divertindo, assim julgava Deusa. E o menino foi atendido.

Doutora Suzana disse que tiveram muita sorte, pois a pneumonia estava em estágio avançado e que se o menino tivesse ido para a emergência em um dia comum, talvez não tivesse sobrevivido. A Upa dali costumava ser muito cheia. E Deusemar ainda pensou que hoje estaria insuportável, pois a quantidade de gente doida no carnaval só contribui para que os hospitais fiquem ainda mais cheios. Vai ver foi um milagre. O milagre do carnaval.

Com a situação sob controle a Dra Suzana garantiu que o menino ficaria bem. Se tudo fosse feito da maneira correta e que se fosse preciso iriam até mesmo tentar vaga em um hospital maior. A noite foi longa para Deusa, Sidney e toda a sua família. Ela ali, sentada num banco improvisado ao lado do filho, abaixou a cabeça e agradeceu a Deus baixinho por ter seguido o seu instinto de mãe e ter ficado com ele e também pela doença ter se manifestado justamente naquele dia. Pois como a médica mesmo lhe tinha dito, com a Upa vazia tudo foi mais fácil.


Em um mês o menino já estava novinho em folha, correndo e bagunçando por ai. E na sala da casa, ao lado do sofá havia um manequim que usava a fantasia daquele fatídico carnaval. Estava ali como lembrança. Para recordar não as lembranças de uma Sapucaí cheia e sim de um hospital vazio e da vida de seu filho Sidney. 



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quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Adeus II

Por Bernardo Sardinha

- Ele vai pular! – gritou uma criança esganiçada levando uma multidão de curiosos que se acumularam, em pânico, nas calçadas da Rua Toneleros em Copacabana. Volta e meia um “Não pula não!”, era escutado, mas o suicida, continuava equilibrado no parapeito do oitavo andar, rezando de olho fechado e agarrado a uma bíblia. Por causa do colarinho, acreditava-se que era um padre, mas mesmo assim, surgiram boatos de que era um doente mental ou um drogado.

Uma moça apareceu na janela perto do “padre” e aos prantos conversava com ele.

- Isso é melhor que novela! – disse uma senhorinha na calçada.

- O que será que ela está falando? – disse outro curioso.

A moça esticou o braço e o padre deu a mão a ela, deixando a bíblia cair. Na janela mesmo, os dois se beijaram para o delírio da galera que vibrou como se fosse um gol contra o Flamengo, e um engraçadinho gritou: “- Então era ela a mulher do padre!”
Ninguém sabe muito bem ao certo o que aconteceu, mas, dentro daquela bíblia encontraram uma foto da moça, marcando as páginas dos dez mandamentos.


Continua....


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quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Às Quartas – Parte 4

Por Marcela de Holanda

          Ela estava tão chocada que o bilhete escorregou da sua mão e caiu no chão. Um turbilhão de sensações se espremiam correndo junto ao seu sangue. A felicidade e o pavor brigavam pra ver quem chegava mais rápido ao seu coração. Eram tantas vozes falando ao mesmo tempo na sua cabeça que ela resolveu não escutar nenhuma delas e simplesmente correu.

           Correu sem saber para onde ia. No fim, suas pernas magrelas acabaram a levando para um hospital e depois outro e outro. Mal sabendo quem era, saiu perguntando para um monte de desconhecidos se algum deles sabia do desconhecido dela. Aquele homem alto, de cabelo preto, olhos verdes e uma manchinha no meio da testa. Ela precisava encontrá-lo. Precisava vê-lo. Precisava quebrar o silêncio. Precisava que ele estivesse vivo. Mas ninguém sabia. Ninguém podia informar. Se ela soubesse ao menos o nome dele...

    Voltou para casa e paralisou. Ela não sabia mais o que fazer. Passou uma semana sem comer, sem dormir, sem trabalhar. Na quarta seguinte, teve uma luz. Talvez ele tivesse sobrevivido e fosse procurá-la no banco da praça. Trocou de roupa e foi trabalhar. Alimentou-se de esperança para encarar o tanto de explicações que teria que dar por lá. Mas ninguém perguntou nada. Como se não tivessem notado a ausência dela.

     Sentou em sua mesa e, encarando o monitor à sua frente, lembrou. Ele tinha dito que a janela dele dava de frente para a mesa dela. Olhou para fora, para o prédio em frente. Não viu ninguém que se parecesse com ele. Mas para que esperar até a hora do almoço? Alguém naquele prédio acabaria com a sua agonia.



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terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Casamento Matuto

Por Rec Haddock


Igreja. Dia. Padre está no Altar, esperando. Noiva anda pela nave da Igreja, até chegar ao altar, quando percebe que o noivo não está lá. Começa a chorar copiosamente.

Noiva – Cadê o Noivo?

Padre – Não sei, minha filha. Vai ver que o burro quebrou a pata. O que ele estava montando, naturalmente.

Noiva (histérica) – Ele tinha que estar aqui! Ele tinha que estar aqui!

Padre – Que sorte que seu pai o trouxe, então.
         
      Entram o Noivo, e o pai da noiva, este apontando uma arma para aquele. O noivo parece tentar escapar do casamento a qualquer custo, mas a ameaça é forte o suficiente para que isso não aconteça. Assim que a noiva o vê, fica radiante. Eles chegam ao altar.

Noivo – Oi amorzinha. Desculpa o atraso. O seu pai fez um estrago danado lá em casa, e eu demorei pra arrumar tudo.

Pai da Noiva – Eu queria era fazer um estrago nessa sua cara, que parece que tem pouco buraco. Mas parece que a minha filha gosta dela assim, então vou deixar desse jeito por enquanto. Mas se tu tentar fugir, a Clotilde (mostra a arma) abre um terceiro olho bem no meio da sua testa.

Noiva – Ai, pai. Que horror.

Noivo – É, que horror!

Noiva – Vamos logo com esse casamento, seu padre. Antes que o meu pai faça uma besteira.

Padre – Bom. Nós estamos aqui reunidos para reunir em uma sagrada reunião estas duas almas. Chamamos isso de casamento. De forma que se alguém aqui quiser desunir esse casal antes que eu possa uni-lo, terá uma chance! Aqui e agora! Este é o momento. Nem antes, nem depois. Portanto, que, por favor, fale agora, ou não fale jamais!
         
       Entra um bêbado do meio da plateia.

Bêbado – Eu tenho! Esse cabra sem-vergonha embuchou a minha amiga!

Noiva – Amiga?

Pai da Noiva (para o noivo) – É verdade, isso?

Noiva – Fala que não! Fala que não!

Noivo – Né não! Nem conheço esse cabra!

Bêbado – Mas a Cremilda você conhece, muito bem!

Noivo – Crê, quem? Olha só. Eu não tô a fim de morrer (tira o cano da arma com o dedo indicador, calmamente, da sua direção e o aponta para o bêbado) porque tu ta falando besteira. Então, pelo amor de Cristo Salvador, alguém tira esse bêbado da minha frente!

Bêbado – Ô virge santinha! (ajoelha e joga as mão pro céu, pedindo ajuda à santa) Tira esse troço da minha fuça, que não bebo mais hoje, nem nunca mais!

Pai da noiva – Seguranças! Tirem esse cabra daqui, que não mato ele hoje, que é dia festa.
Seguranças entram em cena, e arrastam o bêbado para fora da Igreja.

Padre – Ótimo. Agora podemos continuar com essa união de Deus. A não ser, é claro que, mais alguém.

Grávida surge no fundo da nave.

Grávida – Pode ir parando, aí seu padre, que o senhor que é homem decente não pode cometer a indecência de casar esse estrupício!

Noiva (exasperada) – Credo na cruz! Quem é você agora?

Grávida – Oxe, se não sou Cremilda, a grávida mais grávida dessa terra! E o pai é esse bexinguento aí, ó.

Pai da Noiva – Meu Pai! Mas agora tu vira viúva antes de casar, filha! (aponta a arma pro noivo. Este troca de lugar no altar com a noiva, colocando-a entre ele e a arma)
Noivo – Viro não! (Noiva fica assustada sob a mira da arma e vai pra trás do noivo)

Pai da Noiva – Vira sim! (Noivo volta para trás da noiva e esta gag repete-se 3 vezes, com o noivo e a noiva alternando os lugares e o pai da noiva e o noivo repetindo “vira sim” e “viro não”. Ao fim da terceira repetição, a Grávida interrompe a gag)

Grávida – Chega! Ninguém vai matar o pai do meu menino!

Bêbado volta

Bêbado – Mas é menino Crê Crê? Não sabia!

Noiva – Para todo mundo com zanzeira, que eu já tô é tonta! Você é o pai dessa criança, meu malvado favorito?

Noivo – Sou não, minha caramelinha. Olha a intimidade desses dois aí! O pai do filho dessa doida deve de ser o bêbado, mesmo!

Bêbado – Eu vou ter um filho? Ai, que felicidade! (Abre os braços e anda em direção à grávida, que abre os braços para receber o abraço, mas quando o bêbado chega perto dela, muda de direção e abraça o pai da noiva) Tem um charutinho aí pra gente comemorar, coronel?

Pai da Noiva – Charuto? Tá doido, cabra? (se desvencilha do abraço, e junto com o noivo, carregam o bêbado para fora da igreja. A grávida vai atrás, falando com o bêbado)

Grávida – Se for seu eu quero é uma pensão, seu safado. E vamo cortar essa cana, aí, que meu filho vai precisar de muita fralda! (Saem o bêbado e a grávida. O pai da noiva volta e o noivo aproveita a oportunidade para se esconder no meio do público).

Noivo (para uma mulher na plateia) – Me ajuda a me esconder, gatinha, por favorzinho.

Pai da noiva – E cadê meu genro por vir? Sumiu o safado! Damas de honra! Honrem a honra de sua amiga e tragam esse sem vergonha pra cá!

Dama de Honra 1 – Dou quinhentos paus pra quem disser onde ta esse cabra safado!

Dama de Honra 2 – Mas quinhentos não é muito dinheiro não?

Dama de Honra 1 – Dou tudo o que tenho pra ver minha amiga feliz!

Dama de Honra 2 – Então ta.

As duas ficam gritando que dá 500 paus pra quem delatar o noivo. Quando alguém delatar, as damas vão até o noivo e começam a dar tapas na cabeça dele, contando “um pau, dois paus, três paus, quatro paus”, etc. Levam o noivo à pancadas até o altar.

Pai da noiva – Última chance de ficar vivo, imprestável.

Noivo – Tá certo. Desculpe, magnânimo.

Padre – Então vamos logo com isso e chega de interrupções, por favor.
          
Entram duas pessoas, uma vestida de coroinha e outra de bispo.

Bispo – Não tão rápido!

Padre – E agora meu Superior aí do céu? Quem me mandas?

Bispo – Ele manda o seu superior na terra, Padre. Eu sou o Bispo, e preciso ter uma palavrinha em particular com você.
          
      Saem calmamente pela lateral do altar e ficam conversando silenciosamente, no canto.

Coroinha – In nomine patris et filii et spíritus sancti. Amen! (Todos respondem “Amém”, sempre que o coroinha falar amém) Minha amiga, a gente veio te salvar deste casamento então não case com este jumento, amem. O Ju se vestiu de bispo e eu de coroinha pra te avisar que você ganhou na Loteria, amém. Se você casar com esse funhenhento você vai perder metade da grana e são 63 milhões, amém. Daqui a pouco você finge que passa mal, que o Ju vai se vestir de médico pra te tirar daqui, amém. Agora fica quietinha e finge que nada aconteceu, amém.
         
      Sai de cena, enquanto o padre volta com o falso bispo.

Bispo – Fique com Deus, e que Ele os abençoe à todos!

Padre – Amém. (O bispo sai) Bom. Terminadas as interrupções, podemos continuar com o casamento? (Noivo e Noiva respondem ao mesmo tempo)

Noivo – Não!

Noiva – Sim.

Padre – Como? (as respostas se repetem)

Pai da Noiva – Como é que é?!

Padre – Cansei disso, já, meu filho. Vou rezar a sua extrema unção antes que esse cabra te mate.

Noivo – Não! Eu caso!

Padre – Então podemos continuar?

Noiva – Não! Pai! Tô passando mal, paizinho! Me ajuda! Eu acho que vou desmaiar!

Finge um desmaio, e o pai a pega, antes de ela cair no chão.

Pai da Noiva – Um médico! Um médico! Por favor, um médico pra minha filha! (médico surge no meio da plateia e vai até eles. Quando o pai vê o médico e larga a filha no chão, para ir até ela. Leva-a até a sua filha) Dá pra salvar? O que ela tem, Doutor?

Médico – Ih. Isso está feio (olha a noiva. Meche nela. Faz algumas coisas sem sentido) parece que ela está com cachorrombose múltipla de tártaros embrionários vingativos. Isso é uma doença muito severa. Muito difícil de tratar, vamos correr pro hospital agorinha, vamos! (Pai e médico carregam a noiva para fora da igreja. Saem)

Padre – Bom. Já que não Tem Noiva, Não tem casamento, não é?
          Surge uma mulher da plateia.

Noiva 2 – E quem disse que não tem noiva? Tem sim! Eu!

Noivo – Quem é você?

Noiva 2 – Ah. Eu sempre fui louca por você. Agora você ta aqui, todo lindo, de noivo, no altar, na frente do padre. E sem noiva. Isso é um sinal de Deus. Vamos casar e é agora!

Padre – Então vamos com isso, que eu tenho que ir jantar na casa do meu irmão. Pelos poderes em mim investidos pela Igreja, eu os declaro Marido e mulher.

Noivo – E como é isso? Nem aceitei nada disso.

Padre – Então aceite o que te é designado e seja feliz com isso. Noiva, pode levar o seu esposo.


          Noiva pega o noivo pelo braço, e saem de braços dados.



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