Por Rec Haddock
Tudo
estava armado: incontáveis velas espalhadas pela sala, pétalas de rosas jogadas
sobre todo lugar, um lindo jantar disposto sobre a mesa da frente. Reconhece a
cena, leitor? É claro que sim. Não é difícil reconhecer. Ashara também
reconheceu-a - e perdeu o fôlego - quando entrou no recinto, todos nós
percebemos.
Não
foi um momento íntimo, o deste pedido. Não mesmo. A sala em que nos
encontrávamos era um daqueles auditórios gigantescos nos formatos de um teatro
grego, com andares e andares de carteiras para os alunos – onde normalmente
tínhamos aula de Álgebra II - e, diferente de um dia de aula normal, ela estava
lotada de alunos.
Eles
já moravam juntos, é importante frisar. E Will odiava a palavra casamento. Não
compreendia como as pessoas podiam recitar palavras escritas por outras pessoas
nas cerimônias de casamento e acreditar que isso faria deles um casal mais
sério, ou mais maduro.
Para
a sociedade eram casados, de toda forma. Mas não para Ashara. Ela ansiava por
um pedido de casamento desde os seus seis anos de idade. Se ressentia
profundamente de nunca ter sido pedida em casamento e se ressentia mais ainda
de nunca ter sido pedida em casamento por Will.
Mas
Will amava Ashara e não podia permitir que ela carregasse um ressentimento tão
grande por sua culpa. E Will amava poder reafirmar suas convicções em voz alta
e vivê-las na medida em que se gabava delas. E Will queria Ashara e suas
convicções, e todos esperavam pelo dia em que Will iria (ter que) escolher.
Will
anunciou a surpresa a todos, menos à Ashara, e o impensável ocorreu: Ashara não
ficou sabendo com antecedência. Na verdade nenhum de nós ficou sabendo ao certo
o que iria acontecer, pois tudo o que Will disse foi que fôssemos à sala 3 no
dia 27 de Setembro com uma vela cada um. Quando chegamos, a sala já estava
cheia de pétalas, e o jantar já estava na mesa, e Will já estava de terno e
suando feito um porco.
Acendemos
nossas velas e apagamos a luz, e, de repente, o auditório era o universo, e
nós, os amigos do casal, éramos as estrelas que iam iluminar o momento.
Ashara
entrou, perdeu o fôlego, e inspirou profundamente. Começou a rir e a chorar, ao
mesmo tempo, e muitos de nós fazíamos a mesma coisa. Eu, particularmente, não
fazia nem uma, nem outra. Mas devo admitir que chorei um pouquinho, e ri
baixinho. E quando Ashara alcançou Will, ele começou seu discurso:
“Asha,
meu amor. Eu estou aqui ajoelhado, na frente dessa multidão para te decepcionar
um pouquinho. Eu sei o quanto você preza demonstrações públicas de afeto, e o
quanto você quer ser pedida em casamento, mas eu só posso fazer uma das duas
coisas.”
Asha
parou de rir.
“Existem
muitas formas de se demonstrar amor, mas só uma delas realmente é sincera. Tudo
o que perdemos nessa vida pode ser reconquistado, à exceção de uma coisa: o Tempo.
Não posso gastar com outra coisa o tempo que já dispus a você.”
Asha
parou de chorar também.
“E
o tempo vem e vai com o tempo. O que tenho agora, por exemplo, estou escolhendo
gastar com você. E pretendo oferecer mais tempo da minha vida, ainda, a você.
Muito mais. Tempo para esgotar o meu tempo, desde que você escolha fazer o
mesmo por mim.”
Ela
abriu a boca para falar. Mas não falou. Will esperou e esperou. Todos paramos
de respirar por um momento, e quando Will recomeçou, parecia um pedido de
desculpas.
“Outros
diriam apenas: ‘você quer casar comigo?’, mas eu não quero casar com você.
Existem muitas pessoas que casam e não se doam umas às outras. Eu não quero
isso pra gente. Existem muitas pessoas que moram juntas, mas nunca estão
presentes no mesmo cômodo, mesmo que por vezes se encontrem juntas fisicamente.
Eu não quero isso pra gente. Eu quero te dar o meu tempo, você entende? E quero
que você me dê o seu. Você também quer isso?”
Nada.
De repente, parecia que Asha iria embora sem dizer ao menos uma palavra.
“Asha.
Se você quer casar comigo, você precisa entender que eu não posso abrir mão de
quem eu sou. Ou você aceita esse pedido ou me faz virar alguém que não sou para
casar com você.”
E
Asha finalmente falou.
“OK.
Mas você vai ter que me dar muito tempo.”
Quem
ainda não chorara, chorou.
“Então,
amor. Você aceita casar comigo?”
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