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terça-feira, 22 de abril de 2014

A linha horizontal ao fim da vertical

Por Rec Haddock

Não tinha nada pra fazer. Na verdade, até tinha, mas tudo o que tinha pra fazer não era legal de fazer, então não tinha nada pra fazer.

Eu podia jogar alguma coisa no PS4, de novo, supunha, mas já tinha jogado tudo tantas vezes, que já tinha perdido a graça. Não tinha desafio nenhum em jogo nenhum.

Livros estavam fora de questão. Boas histórias eram as histórias que eu fazia acontecer, não as que os outros tinham inventado. Não tinha filmes nacionais que prestassem em lugar nenhum e eu não tava a fim de ler legendas, hoje. TV, sempre está fora de questão.

Eu sabia do que precisava. Precisava de ação.

Estava frio, mas saí de casa sem casaco. Subi no telhado do meu prédio e umas telhas quebraram debaixo dos meus pés, e eu sabia que ia ouvir do meu pai pra caralho por causa daquilo, mas não me importava. Quando meu pai usava sua autoridade de síndico e sua autoridade de pai ao mesmo tempo, era ridículo. Perdia toda a autoridade – não que tivesse alguma quando usasse só uma das duas. Meu pai é fraco.

Pisei na calha do telhado. 15 andares abaixo, as pessoas eram formigas. Cada uma cumprindo sua função no imenso formigueiro que a gente chama de São Paulo.

Às vezes fico pensando como chegamos a esse ponto. Todas as coisas grandiosas que a humanidade construiu, todas as coisas impossíveis realizadas, e uma massa gigantesca de pessoas pronta pra viver sua vida do início ao fim sem fazer nada pelo que valha a pena viver. Imagino que nem todos possam construir monumentos pra si. Não há espaço. Mas alguns monumentos têm que ser construídos.

Minhas articulações doíam de frio e tensão.

Precisava fazer alguma coisa nova, então decidi descer. E quando desci, as pessoas pareciam maiores e maiores, e eu menor e menor, até que ao chegar embaixo, subi.



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