Por Rec Haddock
Não
tinha nada pra fazer. Na verdade, até tinha, mas tudo o que tinha pra fazer não
era legal de fazer, então não tinha nada pra fazer.
Eu
podia jogar alguma coisa no PS4, de novo, supunha, mas já tinha jogado tudo
tantas vezes, que já tinha perdido a graça. Não tinha desafio nenhum em jogo
nenhum.
Livros
estavam fora de questão. Boas histórias eram as histórias que eu fazia
acontecer, não as que os outros tinham inventado. Não tinha filmes nacionais
que prestassem em lugar nenhum e eu não tava a fim de ler legendas, hoje. TV,
sempre está fora de questão.
Eu
sabia do que precisava. Precisava de ação.
Estava
frio, mas saí de casa sem casaco. Subi no telhado do meu prédio e umas telhas
quebraram debaixo dos meus pés, e eu sabia que ia ouvir do meu pai pra caralho
por causa daquilo, mas não me importava. Quando meu pai usava sua autoridade de
síndico e sua autoridade de pai ao mesmo tempo, era ridículo. Perdia toda a
autoridade – não que tivesse alguma quando usasse só uma das duas. Meu pai é
fraco.
Pisei
na calha do telhado. 15 andares abaixo, as pessoas eram formigas. Cada uma
cumprindo sua função no imenso formigueiro que a gente chama de São Paulo.
Às
vezes fico pensando como chegamos a esse ponto. Todas as coisas grandiosas que
a humanidade construiu, todas as coisas impossíveis realizadas, e uma massa
gigantesca de pessoas pronta pra viver sua vida do início ao fim sem fazer nada
pelo que valha a pena viver. Imagino que nem todos possam construir monumentos
pra si. Não há espaço. Mas alguns monumentos têm que ser construídos.
Minhas
articulações doíam de frio e tensão.
Precisava
fazer alguma coisa nova, então decidi descer. E quando desci, as pessoas
pareciam maiores e maiores, e eu menor e menor, até que ao chegar embaixo,
subi.
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