Por Rodrigo Amém
O velho, sentado à
soleira, balançando suave no alpendre da noite, vigia o horizonte de cabelos
vermelhos. O velho cofia e pensa, pensa e cofia. E o rapaz aparece, saído de
antes, cheirando a mofado perfume de flores. E sorri sépia para a garota
cinzenta em seu mundo de cobre. O velho mareja.
Pela janela aberta, os
jovens se beijam em movimentos fractais que o velho acompanha de perto e de
longe. De perto e de longe. E assim ele viu tudo e de tudo lembrou-se. Viu de
perto os seus olhos crispados de sonhos, mergulhados em contas de promessas de
sim. Viu de longe as pessoas, cochichando matreiras, quebrando o pescoço de
cumplicidade e de inveja.
Viu de perto aquelas
mãos serpenteando em si mesmas, se enroscando em palavras, sob carinhosos
dedões. Viu de longe a igreja, a praça e a morada, cada vez mais longe, cada
vez mais ontem.
De perto, os cheiros que
só tem quem se gosta. De longe o vazio do inverno da escolha. De perto o abraço
que se abraça e que cola. De longe a estrada que só tem uma mão.
O velho, sentado à
soleira, balançando suave no vestíbulo da noite, vigia o horizonte de cabelos
negros cintilantes.
Cofiando e pensando,
cofiando e pensando. O vento frio carrega a fumaça do pito e da alma, morna de
histórias que a janela soltou.
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