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quarta-feira, 13 de agosto de 2014

Quarta?

Por Marcela de Holanda

Se você veio aqui buscando uma história com desfecho feliz ou triste, melhor não ler essa. Dessa história eu não sei o final. Apenas sei o que me relataram. Foi um amigo meu terapeuta que não posso revelar o nome e que também não me revelou o nome dela. Então a chamarei de ela mesmo.

Pois a vida dela caminhava assim: domingo, segunda, terça, quinta, sexta e sábado. Como assim? Veremos. A questão começou a ser notada, pois ela parou de aparecer nas quartas-feiras para trabalhar. Ninguém tinha coragem de questionar ou reclamar com ela. Afinal, ela parecia surpreendentemente bem nos outros dias. Bem demais para quem tinha passado pelo que ela tinha passado. E como parecia bem, ninguém tocava no assunto.

Mas, às quartas, ela sumia. Resolveram dar um tempo para ela. Depois de seis quartas, um colega de trabalho perguntou como quem não quer nada o motivo dela não ter aparecido no dia anterior. E ela respondeu, sem hesitar, que não sabia do que ele estava falando. Ela tinha ido trabalhar no dia anterior e sabia que ele a tinha visto. Os dois tinham conversado como sempre. Ele estranhou, mas não quis levar a discussão adiante. Preferiu dizer que devia ter se confundido. A fofoca se espalhou pelo escritório. Por quanto tempo ela continuaria faltando o trabalho e negando?

Sem coragem de conversar diretamente com ela, mas preocupada com a situação, uma amiga do escritório mais próxima, que sabia que ela estava fazendo terapia, pois ela mesma tinha indicado, resolveu procurar seu terapeuta. Queria saber como ela estava reagindo e se essas faltas dela tinham relação com a tragédia. E qual foi a sua surpresa ao descobrir que o terapeuta não tinha ideia do que tinha acontecido. Ela nunca tinha mencionado nada sobre o acidente. Nem sobre o marido e muito menos sobre a filha. Tinha entrado na terapia há algumas semanas, mas dizia que não sabia bem o motivo.

Na consulta seguinte, ele tentou induzi-la a contar de várias maneiras. Mas ela não falava nada. Era como se eles não tivessem existido na vida dela. Aparentemente, a cabeça dela tinha bloqueado todas as lembranças relacionadas aos dois. Para tentar acabar de montar o quebra-cabeça, o terapeuta ligou para ela numa quarta-feira. Ninguém atendeu. Ligou para o trabalho e ela não tinha ido trabalhar como em todas as quartas. Preocupado, abriu uma exceção e apareceu na casa dela. Estava com uma sensação estranha e tocou a campainha inúmeras vezes até ela abrir. Mas não foi bem ela que abriu. O corpo era dela, mas ela não estava lá. Não o reconheceu, não sabia quem ela era nem onde estava, não sabia nada de nada. E assim, ficou sentada o dia todo. Ele passou a quarta inteira lá ao lado dela, observando o seu silêncio até ela adormecer sentada. Na manhã seguinte, ela parecia normal de novo. Foi como se a quarta não tivesse existido.


O terapeuta conversou novamente com a amiga dela para saber detalhes do ocorrido. Tinha sido numa quarta-feira. O marido pegou a filha na escola e os dois foram juntos buscá-la no trabalho. Mas nunca chegaram lá. Um ônibus bateu no carro e os dois morreram na hora. Ela enterrou os dois e depois os apagou da memória. Domingo, segunda, terça, quinta, sexta e sábado, eles nunca tinham existido e ela seguia sua vida feliz. Já nas quartas, ela não existia. Apenas havia a dor ali. Uma dor de nem saber existir.



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