Por Marcela de Holanda
Depois de ouvirem o discurso de Rodrigo, todos, exceto Bruno que ainda oscilava entre o próprio drama e o que acontecia à sua volta, prestavam abertamente atenção ao que se passava na mesa 5.
Camila – Rodrigo. Você me
decepcionou mesmo por não ter falado nada. Mas tudo bem. Eu entendo que tenha
sido difícil. Mas é só. Aliás, melhor não falar nada do que falar as besteiras
que você acabou de falar. Quando foi que eu te pedi alguma coisa que não fosse
o seu amor? É claro que eu tenho meus sonhos, como toda mulher, de casar, me
vestir de noiva, ter uma festa. Mas eu abriria mão de todos eles sem pensar
para ser a sua mulher. Para estar do seu lado nos momentos mais simples do dia
a dia. Para te encontrar todos os dias depois do trabalho. Para conversar todas
as noites antes de dormir. Para te dar um beijo de bom dia mesmo que você volte
a dormir logo depois. Para brigar sobre a quantidade de filhos que a gente quer
ter. Para mim, é melhor ter tudo isso logo, do que esperar para ter dinheiro
para fazer isso com tudo que você acha que eu tenho direito. Não tem nada mais
valioso do que o tempo. Eu sou enfermeira. Sou lembrada do valor dele todos os
dias. Vejo o quanto ele é finito e imprevisível. Se você pode e quer me dar o
seu amor e o seu tempo, eu já sou a mulher mais feliz. Você, como professor,
não aprendeu isso nos livros?
Rodrigo – Então você
aceita casar comigo, sem anel e sem nada? Você não vai ficar se lamentando no
futuro de não ter tido essas coisas?
Camila – Esquece o futuro.
Eu aceito!
Os dois se beijam.
Camila – Mas, espera aí.
Você disse que estava quase conseguindo o dinheiro e que tinha falhado. O que
aconteceu?
Rodrigo – Você promete que
não vai brigar comigo?
Camila – Prometo.
Rodrigo – Foi o João. Ele
apareceu lá em casa. Tava encrencado. Precisava da grana.
Camila – Você deu o
dinheiro do nosso casamento para um drogado? Você tá maluco, Rodrigo? Que uso
você acha que ele vai fazer desse dinheiro? E além disso, você não vê o João há
um tempão. Que grande amigo é esse que só aparece para pedir dinheiro?
Rodrigo – O João é meu
melhor amigo de infância, Camila. Você sabe disso. Ele tava lá do meu lado
quando ninguém mais tava. Eu dei o dinheiro para ele e daria de novo. Você sabe
o quanto me dói ver ele perdido assim na vida? Podia ser comigo. E eu sei que
ele faria a mesma coisa por mim. Eu dei a grana para ele. Ele estava devendo.
Corria risco de vida. Você sabe como são essas coisas. Mas não dei de graça
não. A gente foi lá, pagou a dívida e depois fomos juntos para a clínica. Ele
tá internado. Tem três meses já. Tá se recuperando muito bem. To feliz por ele.
Camila – E por quê você
não me contou isso? Olha, se a gente vai mesmo casar tem que começar a dividir
mais as coisas. Confia em mim, tá? O que você fez foi certo. To orgulhosa de
você. Você é um cara mesmo muito especial.
Cláudia, uma das irmãs da
mesa 4 se aproxima de mesa 5 emocionada pela história e pelos drinks tomados
sem refeição.
Cláudia – Com licença.
Desculpem mas eu não pude evitar de ouvir a conversa de vocês. Vocês são um
casal tão fofo!!!! Ooops, foi mal eu bebi um pouco demais. Eu não pude evitar
de vir aqui dar os parabéns. E tem mais uma coisa. Eu e a minha irmã acabamos
de abrir um novo negócio. É uma casa de festas aqui pertinho. Não é nada muito
luxuoso, mas precisamos de uma primeira festa para podermos usar de divulgação
e ouvindo a história de vocês achamos que não teria inauguração melhor do que o
casamento de vocês. Nós queremos oferecer o espaço e a decoração, por nossa
conta. Em troca, vocês autorizam o uso das fotos e da história de vocês. Que
tal?
Camila – Uau!
Rodrigo – Isso é bem
inesperado. Nós podemos pensar um pouco? Como é o seu nome mesmo?
Cláudia – Cláudia.
Camila – A gente aceita.
Rodrigo – Se a noiva
diz... Muito obrigado, dona Cláudia.
Cláudia – Aqui está o meu
cartão.
Aliviado por toda a
confusão ter se resolvido bem, o dono do restaurante, Francis, que participava
da reunião de negócios na mesa 2 e sua mulher, Denise, ainda mais sensível pela
maternidade recente, também se aproximaram da mesa 5.
Francis – Deixem eu me
apresentar. Eu sou o Francis. Dono do estabelecimento. Em primeiro lugar, em
meu nome e da minha equipe, sentimos muito pelo ocorrido. E como uma forma
mínima de compensação...
Denise – Gostaríamos de
oferecer o buffet do casamento de vocês! Ai, vocês vão ser tão felizes!
Parabéns, Camila! Você tem um homem e tanto! Com todo respeito, claro.
Francis – É isso mesmo.
Teremos muito prazer em participar de alguma maneira dessa celebração. Me procurem
aqui na quarta que vem para discutirmos as opções de menu e quantidade de
convidados.
Na volta para a mesa 2,
Francis e Denise conseguem fechar o negócio que tentavam há horas. Os
interessados em abrir uma franquia na Europa ficaram impressionados com a
generosidade dos dois e acharam que seria uma boa iniciar a sociedade. Na mesa
1, José, o pai de família que comemorava sua promoção, se empolga e fica
pensando em como poderia contribuir também para essa união. Lembra de um
detalhe que ouviu na conversa.
José – Acho que a esse
ponto vocês já perceberam que todos nós ouvimos a conversa de vocês. Eu
gostaria de poder ajudar também. Rodrigo, você é professor de que?
Rodrigo – Eu? Dou aula de
história para Ensino Médio.
José – E o seu horário
está todo preenchido?
Rodrigo – Não, não. Dou
aula só duas vezes por semana. Tá difícil o mercado. Sabe como é?
José – Que maravilha!
Então acho que também posso contribuir. Sou professor de história também e
acabei de ser promovido a diretor da escola onde trabalho. Vou precisar de
alguém para me substituir. Esse é o meu e-mail. Por favor, me envie o seu
currículo e marcaremos uma entrevista para assim que possível. Com licença. Ah,
e parabéns o casal.
Camila – Obrigada.
Rodrigo – Caraca, amor.
Que demais! Viu só? Deus é mesmo muito bom. Você não sabe o quanto fico
aliviado de saber que você vai ter pelo menos uma parte do que merece. Obrigado
por me aceitar apesar de tudo. Eu te amo.
Camila – Eu também te amo.
Bruno paga a conta e
levanta da sua mesa para ir embora. Antes de sair, passa pela mesa 5.
Bruno – Com licença,
senhorita. Mas acho que isso te pertence. Espero que o cavalheiro não
se incomode e não me entenda mal. Mas acho que ele estava destinado a pertencer
a ela desde o início.
Bruno deixa o anel em cima
da mesa e sai pensando em ligar para Aline e no quanto a vida é mesmo imprevisível. Camila olha para
Bruno buscando aprovação.
Camila – Posso?
Bruno – É como ele disse.
Não existe mulher no mundo que mereça mais do que você. Ou que fique mais
bonita com ele.
Camila coloca de volta o
anel. Seus sonhos foram devolvidos de uma maneira louca. Custava a acreditar
que aquilo tudo era real. Mas o real não era mesmo muitas vezes inacreditável?
Das surpresas que o futuro lhe reservaria ou quanto tempo ainda teria nessa
vida, ela nada sabia. Mas de uma coisa tinha certeza. Nunca esqueceria aquele
jantar.
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