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quarta-feira, 30 de julho de 2014

O Jantar – Parte final

Por Marcela de Holanda


Depois de ouvirem o discurso de Rodrigo, todos, exceto Bruno que ainda oscilava entre o próprio drama e o que acontecia à sua volta, prestavam abertamente atenção ao que se passava na mesa 5.

Camila – Rodrigo. Você me decepcionou mesmo por não ter falado nada. Mas tudo bem. Eu entendo que tenha sido difícil. Mas é só. Aliás, melhor não falar nada do que falar as besteiras que você acabou de falar. Quando foi que eu te pedi alguma coisa que não fosse o seu amor? É claro que eu tenho meus sonhos, como toda mulher, de casar, me vestir de noiva, ter uma festa. Mas eu abriria mão de todos eles sem pensar para ser a sua mulher. Para estar do seu lado nos momentos mais simples do dia a dia. Para te encontrar todos os dias depois do trabalho. Para conversar todas as noites antes de dormir. Para te dar um beijo de bom dia mesmo que você volte a dormir logo depois. Para brigar sobre a quantidade de filhos que a gente quer ter. Para mim, é melhor ter tudo isso logo, do que esperar para ter dinheiro para fazer isso com tudo que você acha que eu tenho direito. Não tem nada mais valioso do que o tempo. Eu sou enfermeira. Sou lembrada do valor dele todos os dias. Vejo o quanto ele é finito e imprevisível. Se você pode e quer me dar o seu amor e o seu tempo, eu já sou a mulher mais feliz. Você, como professor, não aprendeu isso nos livros?

Rodrigo – Então você aceita casar comigo, sem anel e sem nada? Você não vai ficar se lamentando no futuro de não ter tido essas coisas?

Camila – Esquece o futuro. Eu aceito!

Os dois se beijam.

Camila – Mas, espera aí. Você disse que estava quase conseguindo o dinheiro e que tinha falhado. O que aconteceu?

Rodrigo – Você promete que não vai brigar comigo?

Camila – Prometo.

Rodrigo – Foi o João. Ele apareceu lá em casa. Tava encrencado. Precisava da grana.

Camila – Você deu o dinheiro do nosso casamento para um drogado? Você tá maluco, Rodrigo? Que uso você acha que ele vai fazer desse dinheiro? E além disso, você não vê o João há um tempão. Que grande amigo é esse que só aparece para pedir dinheiro?

Rodrigo – O João é meu melhor amigo de infância, Camila. Você sabe disso. Ele tava lá do meu lado quando ninguém mais tava. Eu dei o dinheiro para ele e daria de novo. Você sabe o quanto me dói ver ele perdido assim na vida? Podia ser comigo. E eu sei que ele faria a mesma coisa por mim. Eu dei a grana para ele. Ele estava devendo. Corria risco de vida. Você sabe como são essas coisas. Mas não dei de graça não. A gente foi lá, pagou a dívida e depois fomos juntos para a clínica. Ele tá internado. Tem três meses já. Tá se recuperando muito bem. To feliz por ele.

Camila – E por quê você não me contou isso? Olha, se a gente vai mesmo casar tem que começar a dividir mais as coisas. Confia em mim, tá? O que você fez foi certo. To orgulhosa de você. Você é um cara mesmo muito especial.

Cláudia, uma das irmãs da mesa 4 se aproxima de mesa 5 emocionada pela história e pelos drinks tomados sem refeição.

Cláudia – Com licença. Desculpem mas eu não pude evitar de ouvir a conversa de vocês. Vocês são um casal tão fofo!!!! Ooops, foi mal eu bebi um pouco demais. Eu não pude evitar de vir aqui dar os parabéns. E tem mais uma coisa. Eu e a minha irmã acabamos de abrir um novo negócio. É uma casa de festas aqui pertinho. Não é nada muito luxuoso, mas precisamos de uma primeira festa para podermos usar de divulgação e ouvindo a história de vocês achamos que não teria inauguração melhor do que o casamento de vocês. Nós queremos oferecer o espaço e a decoração, por nossa conta. Em troca, vocês autorizam o uso das fotos e da história de vocês. Que tal?

Camila – Uau!

Rodrigo – Isso é bem inesperado. Nós podemos pensar um pouco? Como é o seu nome mesmo?

Cláudia – Cláudia.

Camila – A gente aceita.

Rodrigo – Se a noiva diz... Muito obrigado, dona Cláudia.

Cláudia – Aqui está o meu cartão.

Aliviado por toda a confusão ter se resolvido bem, o dono do restaurante, Francis, que participava da reunião de negócios na mesa 2 e sua mulher, Denise, ainda mais sensível pela maternidade recente, também se aproximaram da mesa 5.

Francis – Deixem eu me apresentar. Eu sou o Francis. Dono do estabelecimento. Em primeiro lugar, em meu nome e da minha equipe, sentimos muito pelo ocorrido. E como uma forma mínima de compensação...

Denise – Gostaríamos de oferecer o buffet do casamento de vocês! Ai, vocês vão ser tão felizes! Parabéns, Camila! Você tem um homem e tanto! Com todo respeito, claro.

Francis – É isso mesmo. Teremos muito prazer em participar de alguma maneira dessa celebração. Me procurem aqui na quarta que vem para discutirmos as opções de menu e quantidade de convidados.

Na volta para a mesa 2, Francis e Denise conseguem fechar o negócio que tentavam há horas. Os interessados em abrir uma franquia na Europa ficaram impressionados com a generosidade dos dois e acharam que seria uma boa iniciar a sociedade. Na mesa 1, José, o pai de família que comemorava sua promoção, se empolga e fica pensando em como poderia contribuir também para essa união. Lembra de um detalhe que ouviu na conversa.

José – Acho que a esse ponto vocês já perceberam que todos nós ouvimos a conversa de vocês. Eu gostaria de poder ajudar também. Rodrigo, você é professor de que?

Rodrigo – Eu? Dou aula de história para Ensino Médio.

José – E o seu horário está todo preenchido?

Rodrigo – Não, não. Dou aula só duas vezes por semana. Tá difícil o mercado. Sabe como é?

José – Que maravilha! Então acho que também posso contribuir. Sou professor de história também e acabei de ser promovido a diretor da escola onde trabalho. Vou precisar de alguém para me substituir. Esse é o meu e-mail. Por favor, me envie o seu currículo e marcaremos uma entrevista para assim que possível. Com licença. Ah, e parabéns o casal.

Camila – Obrigada.

Rodrigo – Caraca, amor. Que demais! Viu só? Deus é mesmo muito bom. Você não sabe o quanto fico aliviado de saber que você vai ter pelo menos uma parte do que merece. Obrigado por me aceitar apesar de tudo. Eu te amo.

Camila – Eu também te amo.

Bruno paga a conta e levanta da sua mesa para ir embora. Antes de sair, passa pela mesa 5.

Bruno – Com licença, senhorita. Mas acho que isso te pertence. Espero que o cavalheiro não se incomode e não me entenda mal. Mas acho que ele estava destinado a pertencer a ela desde o início.

Bruno deixa o anel em cima da mesa e sai pensando em ligar para Aline e no quanto  a vida é mesmo imprevisível. Camila olha para Bruno buscando aprovação.

Camila – Posso?

Bruno – É como ele disse. Não existe mulher no mundo que mereça mais do que você. Ou que fique mais bonita com ele.

Camila coloca de volta o anel. Seus sonhos foram devolvidos de uma maneira louca. Custava a acreditar que aquilo tudo era real. Mas o real não era mesmo muitas vezes inacreditável? Das surpresas que o futuro lhe reservaria ou quanto tempo ainda teria nessa vida, ela nada sabia. Mas de uma coisa tinha certeza. Nunca esqueceria aquele jantar.

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