É madrugada. Chove.
Me olho no
espelho do meu pó compacto após arrancar um pelinho saliente da sobrancelha com
a pinça. Meu rosto está visivelmente mais magro. Bom pra mim. Meu manequim mudou, minha alimentação, meu
humor e minhas expectativas sobre mim mesma também mudaram. Os problemas também
ganharam outra dimensão: antes o que era problema, agora, não mais o é. E o que
era levado numa boa ganhou cara de problema.
Eu mudei. As
taxas do meu colesterol abaixaram e a vitamina D está em falta, o que me fez
ser adepta de suplementos e fui obrigada a acordar cedo e aproveitar o sol da
manhã. Isso tudo me fez ter outras responsabilidades, precisei crescer e ter
mais disciplina comigo mesma. Ainda bem, assim a coisa não ganha um tom monótono
e a vida ganha um colorido.
Como hoje em dia
escrevo pouco usando a caneta, minha letra também já não é mais a mesma. A
letra bonita e caprichada da escola ficou um pouco preguiçosa e “garranchuda”. Falta
de exercício tem um preço. Digo isso em todos os sentidos. Para de ler por um
tempo para você ver só! Fica sem malhar por um mês que seja, que ai quando você
for subir uma escada vai entender bem o que eu digo.
Minha pele
parece ter amadurecido juntinho com meu coração e algumas ruguinhas me fazem
lembrar de preocupações que por um tempo eu já havia esquecido. Sou outra
dentro de mim mesma. O cabelo certinho ganhou uma cara bacana, as roupas
adequadas e monótonas foram enriquecidas com estilo e eu não fiquei rica,
apenas sai da zona de conforto e aprendi a garimpar, procurar, criar... Ter uma
aparência muito certinha, muito corretinha cansa e pode fazer com que você
aparente algo “beeemm” esquisito e até um pouco chato. É necessário ter uma
harmonia, o interior e exterior precisam se complementar.
Ah, com o tempo
a gente percebe que ninguém é perfeito e que nem tudo precisa estar sob
controle, descobri que para ter estilo o importante (em primeiro lugar) é
agradar a mim mesma. Sem ser cafona, sem ser brega, mas também sem ser monótona
e caxias. E hoje sou outra dentro de mim mesma. Uffa! Que bom. A mudança quando
vem aos poucos gera menos expectativas e garante maior efetividade.
Esse ano a minha
unha do pé caiu pela primeira vez e sim eu tive mais dores de cabeça e acne do
que quando eu era adolescente. As responsabilidades aumentam e a chegada ao pódio
parece se atrasar. E pra quem achava que viver era tranquilo a realidade te
mostra o quão a vida pode ser cruel. Vai ver que é por isso que tem tanta gente
louca por ai, gente que não consegue lidar com essa coisa confusa chamada de vida.
Gente que não consegue se segurar e sai cambaleando e se quebrando por ai.
Nesse tempo de
sobrevivência eu descobri algumas verdades: não há como viver sem o apoio do
Criador, as pessoas vão te decepcionar o tempo inteiro e se você não fizer a
sua vida acontecer, ninguém fará. Às vezes me sinto como em um naufrágio onde
há apenas um barco, muitas coisas boiando em volta do meu corpo e muito de
longe, bem lá no fundo e quase impossível de alcançar eu vejo terra. Nesse
caso, aguardar resgaste nunca foi uma opção. É preciso lutar até o fim.
Sou outra dentro
de mim mesma.
Eu já não caibo
dentro de mim.
E cada dia que
passa eu amo mais quem eu sou e descubro como é bom ser eu.
E isso não me
impede de sofrer por sonhos não realizados, metas não cumpridas, sofro também
por não exercitar a minha arte como gostaria, com as pedras no meio do caminho,
com os tropeços e com as decepções. Mas como uma sobrevivente do naufrágio de
mim mesma, eu diria de forma extremamente otimista que as coisas, agora,
parecem estar se encaminhando.
Eu sou outra
dentro de mim mesma e já não caibo mais dentro de mim.
Por isso é
chegada a hora do florescer, do brotar e do voar por ai.
Me aguardem!
Pois, eu estou longe de parar por aqui.
Ainda chove
forte. O dia já está amanhecendo.
Gostou do que leu? Esse texto é de autoria de Amanda Leal e sua reprodução total ou parcial dependem de prévia autorização da autora. Entre em contato conosco para maiores informações.
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