Cada dia da nossa vida é de um jeito. Sem regras ou com regras.
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Aqui cada dia é dia de um texto diferente.
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quarta-feira, 28 de maio de 2014

Reencontro

Por Marcela de Holanda

  Nossa! Você está...

—  Velha?

—  Não.

—  Gorda?

—  Não. Aqui. Você está aqui.

—  É. E você também.

—  Pois é. Eu venho sempre aqui. E todas as vezes eu me lembro de você. Mas nunca pensei que te encontraria aqui. De novo.

—  Foi naquele banco ali, né?

—  Sim. O último. Quando você me beijou daquele jeito eu achei que apesar de tudo ia ficar tudo bem.

—  Eu sabia que se houvesse uma despedida não seria a última. Achei que se fugisse podia dar certo.

—  E deu. Eu voltei pro banco com os sorvetes na mão e fiquei esperando um tempo, achando que talvez você tivesse ido ao banheiro e fosse voltar. O sorvete derreteu antes que eu entendesse que aquele era o fim.

—  Quer um sorvete? Dessa vez eu vou lá comprar. O seu favorito ainda é de pistache?

— É. Vai ser estranho tomar esse sorvete dez anos depois. Aqui. Com você. Mas eu aceito. Se você não se incomodar, eu prefiro ir comprar junto com você. Só para garantir.

—  Vamos sim. Posso segurar na sua mão? Ou ela já tem dona?

—  Dona? Não. Ela é minha e eu te empresto pelos velhos tempos.

— Nossa! Você sentiu isso? Parece que deu choque. Cheguei a ficar tonta.

—  Quer soltar?

—  Não. Na verdade, eu quero pedir desculpa. Não foi legal sumir daquele jeito.

—  Tudo bem. Eu acho que mereci.

—  Não. Hoje eu sei que a culpa não era sua. Você não tinha que mudar por mim. Sei que você não fazia por mal. O tempo é engraçado. Me levou a fazer com outras pessoas o mesmo que você fazia comigo. O mundo gira. Nada é. Tudo está.

—  E como você está agora?

—  Com medo.

—  De quê?

—  De você não gostar do que eu me tornei. De estragar as lembranças que eu tenho e as que eu deixei. Eu, pelo menos, fui apagando o que era ruim e guardei só os bons momentos.

—  Já faz tanto tempo que o que você lembra de mim não deve ter mais nada do que um dia eu fui. A memória inventa. Ela engana a gente o tempo todo.

—  Pode ser. Dois sorvetes de pistache, por favor.

—  Ué? Você detestava pistache. Ou foi minha memória que inventou isso?

—  Detestava. Como eu disse. Nada é. Digamos que hoje em dia pistache está o meu preferido.

—  Você acha que a gente pode ter mudado o suficiente para dar certo?

—  Acho que não vamos ter tempo de saber. Estou só de passagem pela cidade. Meu chefe prometeu me transferir de volta pra cá, mas ainda não conseguiu. Pode demorar até três anos.

—  Segura o meu sorvete. Volta lá no banco e fica sentada até que os dois derretam. Eu vou escolher hoje três datas para voltar aqui nos próximos três anos. Se em uma delas a gente se encontrar, a gente casa. Sem perguntas. E você nunca mais foge. Se a gente não se encontrar mas se esbarrar em outro lugar, outra situação, você finge que não me viu e eu vou fazer o mesmo. Olha pra lá. (Ele foge)


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