Cada dia da nossa vida é de um jeito. Sem regras ou com regras.
De qualquer forma, nada é igual.
Aqui cada dia é dia de um texto diferente.
Quer sair da rotina? Fica com o Salada!

sábado, 17 de maio de 2014

O prisioneiro

Por Rodrigo Amém

É um lugar úmido, frio, silencioso. Quatro paredes altas, recobertas de limo e angústia. Uma cela escura e sem janelas, de onde o prisioneiro acorrentado vislumbra duas portas. Uma está a sua frente, dourada, com anjos em alto relevo, destoando do resto do aposento. Por suas frestas, uma luz azul engatinha, acompanhada de uma leve brisa perfumada.

Atrás de si, o prisioneiro vê uma porta rústica e desgastada, rangendo suas dobradiças enferrujadas enquanto parece ser forçada de fora para dentro. Urros, lamúrias e gargalhadas histéricas ecoam pelas falhas na madeira carcomida. Algo está prestes a colocá-la abaixo,com as piores das intenções.

Confuso, o prisioneiro teme por seu futuro. A cada vez que olha para trás, vê a porta velha maior e mais fragilizada pelas tentativas de arrombamento. Toda vez que olha pra frente, reza para que algum daqueles anjos se liberte da forma dourada e venha resgatá-lo antes que seja tarde.

Ao olhar para o teto, o prisioneiro percebe que uma escotilha se abre de tempos e tempos, através dela, pessoas o observam com cara de piedade. Outras, apenas apontam e riem, sarcásticas. Algumas atiram coisas como pão, restos de frutas e frases prontas de livros auto-ajuda. Às vezes, um beijo misericordioso vem de cima e pousa em seus lábios. Após o breve período de alívio que cada beijo proporciona, a porta de trás treme mais furiosa.

O prisioneiro daria tudo para entender porque fora jogado naquele limbo. O que fizera de errado? Que crime cometera? Ele grita,pedindo por sua liberdade. Por um segundo, ambas as portas tornam-se silenciosas. Apenas o barulho de um relógio invisível ecoa pelo aposento. De súbito, a porta dourada começa a se iluminar. Uma cantilena angelical anuncia o que está para acontecer e o prisioneiro sorri em meio a uma oração. É possível ver a maçaneta dourada girando, lentamente.

Mas a porta carcomida inicia uma trepidação febril e descontrolada, acompanhada por urros de uma fera assustadora. A porta angelical queda em silêncio, ainda fechada. Da mesma forma, a porta medonha. Apenas os risos de uma ou outra pessoa na escotilha invadem o silêncio. O prisioneiro fecha os olhos, em desespero. E sente saudades do tempo em que uma mulher não demorava para dizer sim e o não sob pena de atrasar a cerimônia.


Gostou do que leu? Esse texto é de autoria de Rodrigo Amém e sua reprodução total ou parcial dependem de prévia autorização do autor. Entre em contato conosco para maiores informações.

Os comentários postados abaixo são abertos ao público e não expressam a opinião do blog e de seus autores.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigada pela gentileza! Aguardamos a sua volta.