Por Rodrigo Amém
Algumas inovações da vida moderna
realmente conseguem me impressionar. O DVD, a internet e os peitos de silicone,
por exemplo. Afirmações de que o homem pode se superar a todo momento. Nos
últimos dias do século XX, muitas enquetes de rua foram feitas pelos
telejornais do mundo afora, enfocando exatamente esta questão: qual a invenção
mais assombrosa deste século? Muitos lugares comuns como os que eu citei no
início deste texto foram lembrados pelos transeuntes. Mas ninguém lembrou do
meu favorito. Ou melhor, do invento que mais me assombra e assusta. O Videokê.
Filho Hi-tec do ancião Karaokê, o
videokê é o motor de arranque de uma revolução silenciosa vinda do oriente, com
jeito de arma da guerra fria. Começou como uma bobagem saudosista que nisseis,
sanseis e nãoseis importavam para alimentar a sua saudosista fome cultural de
seu país de origem, o Japão. A japonesada se divertia horrores, por horas a
fio, tomando saquê e cantando aquelas musiquinhas de Japan Pop Show. Mas aquilo
era apenas o começo.A febre começou a se espalhar
quando surgiram as primeiras versões de músicas brasileiras adaptadas para o
joguinho. Agora, a brincadeira não era mais apenas um privilégio de gente de
olho puxado. E a coisa começou a degringolar.
O mais impressionante sobre o Videokê
é que ele tem uma capacidade incrível de hipnotizar mentes. Até as pessoas mais
tímidas, donas de vozes acanhadas e com senso rítmico de um corrimão de escada
se acotovelam para cantar "Fio de Cabelo". Respeitáveis senhoras são
capazes de sair no tapa pela posse do microfone. Crianças choram, já que
ninguém deixa que elas cantem Xuxa. Pais bêbados entoam "Borbulhas de
Amor" para esposas constrangidas e logo a seguir, aquela mocinha crente e
com cara de "quero-sumir-daqui" mostrará todo o seu potencial de
Celine Dion cantando o tema de "Titanic". Afinal, o pessoal lá da
Assembleia sempre diz que ela tem uma voz abençoada. Aleluia, irmã. Ninguém
conversa.
Mas todo mundo canta. O Videokê é,
claramente, uma invenção diabólica. Coisa do capeta.
Mas é interessante como é fácil
chamar a atenção das pessoas. É só falar delas mesmas. É isso que o Videokê
faz. Quando a máquina distribui notas aleatórias com mensagens de incentivo,
está falando para o tiozinho careca e gordo que ele realmente impressionou com "My
Way". Quer dizer, mais um pouquinho e o Agnaldo Rayol que se cuide. De ego
inflado, o Tiozinho volta para o fim da fila. Da próxima vez ele chega a 80!
Onde está o maldito cardápio de músicas?
Outro detalhe que merece nossa
atenção é o teor das ilustrações da tela do Videokê. Qual seria a relação entre
aquela foto dos pinguins na Antártida e a música "Morango do
Nordeste"? Seriam os pinguins os verdadeiros morangos? Estariam eles de
malas prontas para enfrentarem a temperatura tropical do Piauí? E aquela
orquídea servindo de cenário para "Emoções", do Roberto Carlos?
Romântico, é verdade. A seguir, um motociclista cruza o deserto num trecho do
rally Paris-Dakkar. "Se chorei ou se sofri, o importante é que emoções eu
vivi...", narra o cantor. Com certeza, o motoqueiro vive melhores emoções
no momento daquela foto do que nós, no momento de sua exibição musical.
Eu tenho uma teoria.
Acho que, por detrás daquelas imagens
belas e da fascinação pelo Videokê, esconde-se um plano maquiavélico de
dominação cultural pacífica. O Japão está tentando conquistar o mundo através
de mensagens subliminares escondidas nas imagens do Videokê. Enquanto ouvimos
Leandro e Leonardo e a imagem nos mostra um camelo passeando perto das
pirâmides, uma mensagem subliminar é transmitida ao nosso córtex cerebral:
"Vocês são meros camelos sul-americanos! Rendam-se ao nosso império
oriental!".
Tá rolando a florzinha na tela. A tia
cantando a versão da Simone da música de natal do John Lennon (estamos em
março). A mensagem subliminar comendo solta. "Abram seus mercados para os
nossos produtos eletrônicos! Vocês serão o adubo para nossa nova ordem mundial!
Rendam-se a nós!". Terríveis, esses japoneses. Duas bombas atômicas não
justificam uma vingança cruel como esta.
Dentro de poucos anos, estaremos
subjugados e a América liderada pelos EUA cairá sob o julgo do Império do Sol
Nascente. Embalado a Whitney Houston, Sula Miranda e Pepino de Capri, nascerá o
quarto Reichokê. Mas todos nós teremos nota 80. Parabéns! Somos quase
profissionais.
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