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sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Moça de fino trato

Por Amanda Leal
            
         
                       Tudo parecia tranquilo numa quarta –feira à noite. Para Karina sua vida estava na mesma, havia acertado em todos os seus planos e escolhas. Encontrar um homem que julgava ser um bom pai para o seu filho, uma família que julgava ser uma boa família para seu filho. Era isso. Ela queria um filho. Um homem. Um varão como ouvia nas novelas de época, desde pequenininha era essa a sua obsessão.
                         Karina não tinha o costume de brincar com bonecas. Para ela eram somente os bonecos que importavam. O que era estranho para uma menininha tão mimada e delicada como ela. Certa vez sua mãe teve que ir a Rua do Ouvidor encomendar um boneco, igualzinho a um bebê porque era difícil de se encontrar boneco menino.
                   Ela cresceu, continuou a mesma menininha mimada. Até um pouco chata, ás vezes, quase sempre chata. Nossa! Como era chata. Mas Karina enganava bem. Tinha até muitos amigos, chatos como ela, mas tinha. Suas amigas eram quase sempre mulheres frustradas na fase dos trinta e cinco, com carreiras em serviço público que ganhavam no máximo cinco mil por mês e via-se claramente que seria o máximo que conseguiriam em suas vidas. Eram todas burras, pois acreditavam que melhorar de vida só seria possível se conseguissem um marido rico e que bancasse tudo. Assim seria bem fácil sobreviver com cinco mil só pra gastarem com si mesmas.

Criado o perfil de Karina, voltemos à quarta- feira à noite.
               
                      Estava bem elegante em um vestido preto colado no corpo, o que evidenciava um pouco suas gordurinhas localizadas. Gordura que ainda não havia perdido desde o nascimento do filho há seis anos atrás. Ah, esqueci de dizer: Karina teve um filho homem. Tudo estava absolutamente do jeito certo. Mas havia algo de forçado na vida dela: Marido escolhido, amigos escolhidos, filho escolhido, casa escolhida, nada era muito comum em sua vida. Nada acontecia pela lei natural. Ela forçava para que tudo desse certo. E saísse exatamente do seu jeito. Karina além de chata era egoísta. Karina mentia.
                   Karina ás dez da noite deixa a sua casa perfeita, seu marido perfeito, seu filho varão perfeito e vai em direção ao seu carro perfeito e segue rumo ao que seria um jantar de negócios. No seu jantar de negócios está Jonas, sentado em um restaurante de classe baixa (estranho Karina ter ido parar ali), afinal, era trabalho. Logo se vê que há uma intimidade no ar. O homem bonito, normal , pobre, ué ela não era casada e cheia de amor pelo marido? Enfim, esse homem fazia com que se sentisse dominante, superior, melhor. No fundo ela era tão seca, tão triste, tão ligada nas aparências. Karina mentia pra si mesma.
                     Estava tão inebriada com aquele encontro que não conseguia nem perceber que estava sendo seguida. Fotografada. Monitorada. Ela e Jonas riam, um segurava na mão do outro, trocavam carícias e na saída do restaurante deixaram escapar um beijo. Pronto. Foi o suficiente.
                 Quando retornou à sua casa tudo estava normal. Estava feliz. Com sua vida de verdade e de mentirinha dando certo. Com sua carreira estabilizada e suas amigas chatas com a vida pior do que a dela, o que lhe oferecia certa vantagem. Tudo ia bem. Jantares chiques, comprava roupas caras, viajava muito. Tudo com o dinheiro do marido. Karina mentia para todos e pra si mesma.
                   No dia seguinte acordou, foi para o trabalho e quando voltou para casa às roupas do marido não estavam mais lá, então correu para o quarto do filho e nenhuma roupa do menino no closet. Pegou o carro e correu para a casa da sogra, onde foi recebida com tamanho desdém e a mesma fez questão de esfregar na cara dela as fotos de ontem à noite. Seu mundo caiu. Ou melhor seus mundos.
                 Karina conseguiu ver o filho que estava com a avó paterna, sorte de justamente nesse dia ela o ter ido buscar na escola. Mas e as roupas da criança? Estavam todas lá. O pai entregou tudo a ela e disse que precisava de um tempo só para ele. Uma coisa era certa: Não queria ver a cara da esposa tão cedo! A sogra de Karina entregou a criança para ela, pois acreditava que não era justo que um menininho daquela idade ficasse longe dos seus pais. Se não podia ter os dois de imediato, que ao menos ficasse perto de um.  No fundo no fundo a sogra sabia que Karina amava o filho e que sempre foi uma mãe dedicada, embora fosse chata.
                    E assim foram passando os anos. Karina agora estava morando com Jonas e seu filho em um apartamento pequeno de dois quartos. A criança passa os fins de semana na casa do pai e ela e Jonas sustentam a casa com certa dificuldade, já que ele não ganha muito e Karina ainda não se acostumou a viver somente com o que ganha. Gasta sempre mais. Precisa recorrer à ajuda dos pais. Ainda bem que o ex-marido banca os gastos do menino.
                  Ao menos agora, ela é uma pessoa só. De certo não ficou pobre, só não era mais rica. De certo não deixou de ser chata, mas amadureceu um pouco. De certo não mudou muita coisa. E é certo dizer que Karina agora é o pivô da separação de seu chefe e de sua mulher. Tudo isso porque ele tem muita grana. E quanto a isso ela não mente. É o que gosta.


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Um comentário:

  1. Amanda, sou suspeita, massss, achei que o teu texto convence com tanta realidade que passa. Foi um texto que me prendeu, gostoso de ler.
    PARABÉNS E SUCESSO SEMPRE!!!
    bjs
    Carla Pinheiro

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