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sábado, 28 de dezembro de 2013

Eufemismos

Por Rodrigo Amém

Ela carrega sobre os ombros um amontoado de peles de pequenos mamíferos mortos, entrelaçados por fios de algodão. Está elegante, sobre o couro de ruminantes mortos que envolvem seus pés. Ele, igualmente irrepreensível, traz seu cabelo untado com banha de origem animal, o que lhe dá um aspecto lustroso e arrumado.

Enquanto o sebo escorre nos castiçais mediante a crepitação da chama, resolvem comer lesmas. Sorriem um para o outro, à medida que seus maxilares vencem a consistência elástica dos pequenos invertebrados. Aproveitam também para beber o sumo de uvas velhas e esmagadas, que havia fermentado pela decomposição há muitos anos. Nem sequer lembrava a fruta fresca que havia sido comprimida pelos pés gordos e pesados de francesas obesas e suadas. E os dois ali, sorrindo. Um pouco depois, saboreiam moluscos crus e brincam com as ventosas gélidas dos tentáculos mortos em suas línguas. Se não fosse pela música ambiente que reverbera, seria possível ouvir a sutil sinfonia da mastigação de ambos.
Logo a seguir, o garçom lhes apresenta aparatos de metal com pedaços de bovinos mortos e em chamas, carbonizando-se lentamente. E eles se deliciam.

Mais tarde, estão sentados em peles de animais dentro de um uma estrutura metálica, sobre uma máquina à explosão que movimenta pedaços circulares de material proveniente de dejetos de répteis extintos. Ele toca o rosto dela, macio, graças à aplicação de lama e restos de vegetais em decomposição. Trocam bactérias e microscópicos restos de moluscos, lesmas e carne morta enquanto esfregam seus lábios sofregamente. A língua dele busca os orifícios auriculares dela e volta, salpicada de cera, a mergulhar na saliva da boca da fêmea, depositando tais resíduos entre as suas gengivas. Os poros dele começam a secretar a ureia que ela suga misturada ao álcool e aos aditivos químicos da essência vinda do mesmo país da moça gorda que pisa uvas.

Daquele ponto em diante, a troca de fluidos corpóreos se dá através de dedos, línguas, lábios, orifícios, reentrâncias e saliências. Um festim de micro-organismos, uma orgia de bactérias, interrompida apenas, talvez, por uma fina membrana de seiva de uma velha árvore sangrada com um facão cego e sujo de um caboclo seringueiro em meio à floresta tropical.

Gases, odores e fluidos exauridos e diluídos pelo ar, ele vai dizer, com seu hálito carregado de secreções genitais:

- Foi bom pra você?


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