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quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Bips e Bops

Por Bernardo Sardinha 






Escutei o salto da médica martelar firme o chão do corredor em meio aos bips e bops das máquinas do CTI.

Passava os dias me perguntando aonde tinha errado, o que eu tinha feito, para não ter uma visita sequer.

A enfermeira me disse que nos três dias em que passei em coma ninguém veio me visitar e por mais três dias fiquei abandonado à própria sorte.

Com a soma nociva de solidão e remédios pesados para dor, não estranhei quando o monitor cardíaco e os aparelhos que limpavam meu sangue começaram a trocar xingamentos.

Era um "Seu filha Bop da puta!" para lá, "Bip veado Bip" para cá.... 

Por tédio, embarquei na minha loucura e imediatamente mandei eles fazerem as pazes. Era apenas um desentendimento bobo sobre qual enfermeira era a mais gostosa, e a cada dose de morfina as conversas ficavam mais animadas e divertidas.

Quando o monitor cardíaco no meio do turno da noite, disse que a médica de plantão era do tipo que "fode gritando", não me contive e eu dei uma gargalhada bem alta.

Imediatamente a tal médica entrou com o cenho cerrado e me perguntou o que estava acontecendo. Diante do meu descontrole, sussurrei engasgado:

- "O monitor..."

Entendendo que eu estava reclamando do som dos aparelhos, a médica de sobrancelhas grossas cruzou a minha frente martelando seu salto alto e, prontamente, tirou o som dos meus únicos amigos.





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