Por Marcela de Holanda
Era um domingo de sol e Fernando olhava desolado para o painel do Aeroporto Internacional Tom Jobim, no Rio de Janeiro, onde dizia que seu voo estava com um atraso de duas horas previsto. Ele já não sabia muito bem porque estava ali. Não estava muito certo da sua decisão. Resolveu dar uma volta pelo aeroporto para refletir antes de despachar sua mala.
Na área de embarques nacionais, uma mulher chamou sua atenção. Ela estava sentada com os pés em cima da cadeira, tinha o cabelo preso de uma maneira meio desajeitada e olhos cor de mel que pareciam devorar o livro à frente. Se aproximou um pouco mais e viu que era um guia de Paris. Uma ideia louca passou pela sua cabeça. Mas ele andava tão mal nos últimos dias que só de pensar naquela pequena loucura foi invadido de uma nova esperança. Resolveu arriscar. Sentou ao lado da mulher que lia o guia e uns minutos depois tomou coragem para falar.
— Com licença, acho que você está na área errada. Os embarques para Paris não são aqui.
— Ahn? Quem disse que eu estou indo para Paris?
— O livro.
— Ah, não. É só um livro.
— Me desculpa então. Presumi errado. Deixa eu me apresentar. Meu nome é Fernando. Posso saber o seu?
— Clara.
— E posso saber seu destino, Clara?
— Curitiba.
— Passeio?
— Mãe.
— Você é de lá?
— Sou.
— Nossa. Não tem nenhum sotaque.
— Faz tempo.
— E você gostaria de ir a Paris?
— Que tipo de pergunta é essa?
— Não é uma pergunta. É um convite.
— Tá louco? Obrigada, mas eu não estou interessada.
— Espera. Você ainda nem ouviu a minha proposta.
— Nem preciso.
— Não é que o você está pensando. Sem querer ofender, eu não estou interessado em você. Eu preciso da sua ajuda. Queria propor uma troca.
— Troca? To ouvindo.
— Olha, eu vou ser bem sincero e direto porque a gente não tem muito tempo. Mas antes de tudo, o mais importante. Você por acaso tá com o seu passaporte aí?
— To. Eu estou sempre com ele. Gosto de pensar que posso ir para onde quiser quando quiser.
— Sabia que você era a pessoa certa. Acontece que eu tenho uma viagem completa reservada para duas pessoas passando pela Itália, França, Inglaterra e Espanha. Mas como você pode ver, eu estou sozinho. Planejei tudo durante um ano para ir com a minha namorada. A gente ia comemorar nosso aniversário de quatro anos de namoro e eu pretendia pedir a mão dela. Mas ontem, com as malas prontas, ela surtou. Não vou entrar em detalhes agora. Mas ela foi embora, disse que eu era muito previsível e que ela não aguentava mais e eu quero provar que ela estava errada. Eu sei que ela é a mulher da minha vida e que ainda vai perceber que eu sou o homem da vida dela. Por isso resolvi ir mesmo sem ela. Porque não é o que ela espera que eu faça. Quando te vi sentada aí me passou uma coisa pela cabeça. Se eu viajasse com uma completa desconhecida seria totalmente imprevisível. E você poderia registrar toda a viagem pra mostrar pra ela tudo que ela perdeu e como eu posso ser divertido. Em troca, você conhece todos esses lugares de graça. Eu compro sua passagem agora e a gente vai.
— Olha, não sei não. Eu não te conheço e nem tenho roupas para isso. Em Curitiba faz frio, mas nem tanto. E eu só trouxe essa mala de mão.
— Eu compro o que você precisar quando a gente chegar lá.
— Mas se estava tudo reservado para um casal, eu vou ter que dormir com você?
— No mesmo quarto. Mas peço para colocarem duas camas de solteiro e não encosto um dedo em você.
— E como eu vou saber que tudo isso é verdade?
— Você vai ter que acreditar na tristeza dos meus olhos.
— Não sei não.
— O voo sai daqui a pouco. É minha última chance de comprar a sua passagem. Ainda tenho que despachar minha mala. Você vai ou não?
— Vou.
— Ótimo. Deixa que eu levo a sua mala.
Clara sorri sem a menor certeza do que está fazendo. Mas não consegue resistir à ideia de mudar seu destino de uma hora para outra. Essa sensação de ser dona do próprio caminho, de mudar seu mundo com as suas escolhas. Furada ou não, era alguma coisa nova acontecendo. A mãe teria que esperar um pouco mais.
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